quarta-feira, dezembro 31

EL PALACIO DE LA MEDIA NOCHE

Estou a ler esta primeira parte, que se assemelha a um prólogo. Vejamos: “antes de proseguir con mi narración y entrar a detallar los acontecimientos realmente significativos de este relato, que tuvieron lugar dieciséis años más tarde, debo detenerme brevemente para presentar a algunos de sus protagonistas”. Gosto da técnica narrativa, sinto-me atraído pela acção inicial, por Calcutá, vou lê-lo até ao fim.
LAS LUCES DE SEPTIEMBRE

Em nota inicial, o autor dá-se conta de que a novela “tiene más elementos de construcción cinematográficos que literários”, e que está concebida como uma história de mistério e aventura.

Começo a leitura: uma carta a Irene. Depois, o pequeno Dorian “empezó a sospechar que la mitad de la población de París la componían abogados y contables, una clase de ratas que habitaban en la superfície”. Sem a continuação, parece a queda de uma família de Montparnasse. Em estilo cinematográfico. Não vou continuar a ler, talvez um dia.
EL JUEGO DEL ANGEL

Sempre que possível, gosto de ler os escritores estrangeiros na língua original. Desta feita, e porque é possível, leio em espanhol, língua acessível a qualquer português minimamente formado. Não tinha lido nada de Carlos Ruiz Zafrón. Aliás, começo agora a lê-lo, e à minha maneira: leio o primeiro capítulo e invisto no critério do gosto. Se gosto, leio de rajada até ao fim. Se não gosto, adeus até nunca mais.

Começo com El juego del Angel. Ao fim de uns minutos leio que “Don Basílio era un hombre de aspecto feroz y bigotes frondosos que no se andaba con ñoñerías y suscribía la teoría de que un uso liberal de adverbios y la adjetivación excesiva eran cosa de pervertidos y gentes con deficiencias vitamínicas”. Advérbios, adjectivos, perversão, gosto do estilo. Vou continuar. E mais quando relevo a militância do candidato a escritor:

—No se embale, pollo. A ver, ¿qué piensa usted deluso generoso e indiscriminado de adverbios y adjetivos?
—Que es una vergüenza y debería estar tipificado en el código penal —respondí con la convicción del converso militante.

Como diria Pedro Vidal, esto sólo es el principio, en diez años yo seré el aprendiz y tú el maestro.

Para continuar.

terça-feira, dezembro 30

PROFECIAS

Disse um dia François de la Rochefoucauld mais ou menos assim: só é sensato quem é da minha opinião. Porque isto de ver bom-senso em quem nos afronta não é fácil… Ou por outra: exige de nós uma mão-cheia de áurea sabedoria. Há dias em que nos apetece ser sensatos, acordamos assim, dizemos a nós próprios “ hoje eu vou perdoar, vou ser bom menino” e pronto, passamos um dia porreiro, a descascar castanhas e a regá-las com vinho. Mas há outros em que, oh valha-me Deus, mais valia termo-nos colado ao colchão. Acordamos chatos, insuportáveis, e fazemos coisas do arco-da-velha.

Nestes últimos dias, deu-me para ler profecias. Não sei porquê, os novos profetas são todos da área financeira. Estamos no fim do mundo, é a bancarrota, vem aí uma guerra mundial, o Sócrates vai pedinchar no Sodré… É um ver-se-te-avias de avisos: eu avisei-te, eu sou Deus, avisei-te, para que compraste essa porcaria, não vês que a bolsa ainda vai cair mais… Estes são os profetas da desgraça, os corvos do pedestal, enfim, os sensatos.

2008 foi um ano muito mau. Mas não porque o ano seja mau, coitado, o ano não tem culpa nenhuma. A culpa, afinal, é dos outros sensatos, daqueles que, sabendo, fingiam que não sabiam. E o ano foi mau, muito mau.

Os corvos dizem que 2009 vai ser pior, muito pior, espirram. São corvos, são negros, miram de cima, do epicentro da tempestade. Espreitam. E aguardam a morte da presa.

O homem de bom-senso sabe que todas as tempestades têm o seu fim. O homem de bom senso sabe que, depois da noite escura vem o dia radiante. E aguarda, confiante, porque tem esperança e acredita.

Eu pressinto que 2009 vai ser um ano muito difícil, mas acredito que o sol ainda nele vai brilhar. Eu creio. E, ao contrário de la Rochefoucauld, dou de bandeja aos corvos os grãos da minha sensatez.

Um Feliz Ano de 2009 para todos.

domingo, dezembro 28

O canário

O meu pai criava canários. Cruzava-os, amarelo com laranja, laranja com vermelho, o resultado era surpreendente. Mais surpreendente ainda era o resultado vocal. Fascina-me o trinado glorioso desta ave bela, que me reenvia aos leves dias da infância. Um dia tive um canário, dava-lhe painço e ovos cozidos, até que um dia tive de sair. Descobri então que um canário é como um filho, que é preciso alimentá-lo, acarinhá-lo. Mas tinha de sair. Bem pedi à vizinha que tratasse dele durante uns dias, mas ela, com uma ternura nada canora, disse-me que não. Portanto, dei-o. Durante seis meses chorei o raio do canário. Que saudades do seu cantar!... Jurei que animais nunca mais. E é verdade, até rima.
O Baião e a dançarina

São seis da tarde, ouvem-se melodias de Natal. O Baião dança com a mãe: finalmente algo interessante. Ele ri-se. Aqui ao lado, sentado num capuchino, enlevo-me em duas palavras e em três toques de telefone. Aquele cromo da TV tem dois cornos de veado, quer ser diferente e é-o à sua maneira. O que vou comer à noite? Haverá roupa velha pelo frigorífico? Aqui ao lado há quem esfregue os dedos de contente, não sei bem porquê – ou talvez saiba. Ai que linda a moça da TV, com sotaque italiano. Quem me dera falar assim, como ela, mas em português. O raio da nossa língua é dura que se farta, tem um som demasiado metálico, razão tem o gerúndio brasileiro, com ar de samba e de ancas a abanar. Meu Deus, as ancas brasileiras são de mais!.. Que vou comer à noite?

quinta-feira, dezembro 25

ARRANHAR

Ontem o P. arranhou-se na árvore de Natal. Não é suposto, mas acontece, principalmente se debaixo tilintam luzes ou ecoam belos presentes. Arranhou-se, pois, ou aranhou-se. Porque no Natal até as aranhas têm direito à ribalta.

Aqui ao lado, nas frígidas escarpas castelhanas, o verbo não arranha, mas araña. E araña porque faz como a araña. Por cá, porque a garganta arranha que se farta quando duplica por exemplo o rr, lá se fortaleceu o verbo. E de arañar temos arranhar. Quem arranha faz como a aranha, assim como que esgravatando, fazendo uns movimentos, uns rabiscos, uns tracitos que às vezes ferem, mas que, outras vezes, sabem muito bem, principalmente quando piscamos os olhos aos embrulhos de Natal.

sexta-feira, dezembro 5

A “INDISCIPLINA” E O BOM-SENSO.

Há um ditado popular que diz: pai impertinente, filho desobediente. Quem tem filhos, quem educa no dia-a-dia, sabe muito bem que, com os filhos, melhor é a palavra do que a bofetada. Aliás, a ideia da bofetada, tão em voga em tempos ditatoriais, já nem pega. Hoje educa-se com exemplos, com persuasão, com bom-senso, e, essencialmente, com muito amor e carinho. Pelo menos, assim é que deve ser. Tenho três filhos que respeito e me respeitam e nunca lhes toquei com um dedo.
Na escola, tenho para mim que um bom professor nunca precisará de castigar um aluno se for realmente um bom professor. Mesmo em contexto de conflito, um bom professor saberá, com sabedoria e bom-senso, dirimi-lo de forma positiva, aproveitando-o para educar. Penalizar um aluno mostrando-lhe o “cartão” amarelo da rua ou o “vermelho” da suspensão não costuma ser eficiente solução.
Li hoje num jornal bracarense, na página relativa ao desporto e a propósito de castigos associativos, que “os jovens são os mais indisciplinados”. No que respeita ao futebol – acompanho jogos de juvenis com assiduidade -, tal afirmação não é verdadeira. Os jovens são puros na forma como jogam e como reagem e a comparação implícita é injusta.
Já o disse noutro texto: o grande problema da formação, do futebol juvenil, é o défice de qualificação técnica e humana da maioria dos árbitros. Em múltiplas situações, os árbitros agem sem bom-senso, punindo onde deverão usar de boa pedagogia. É muito fácil puxar de um amarelo, ou de um vermelho, e exibi-lo ufanamente. Mais difícil é explicar ao jovem o porquê das decisões de forma calma e ponderada. No último sábado assisti a um jogo de juvenis. Jogo muito bem disputado, com disciplina absoluta. Em determinado momento, o árbitro assinalou uma falta, daquelas banais, que acontecem várias vezes durante todos os jogos. De forma abrupta e sobranceira, tirou o cartão amarelo do bolso e mostrou-o a um jogador, jovem de comportamento exemplar. Candidamente ( eu estava muito perto e ouvi), o jovem perguntou ao árbitro: “O que é que eu fiz?”. Imediatamente o árbitro, num gesto inadmissível e prepotente, mostrou-lhe o cartão vermelho. O capitão de equipa, também de forma educada, dirigiu-se ao árbitro e perguntou-lhe porquê. E o árbitro, de forma absolutamente inaceitável, mostrou novamente o cartão vermelho. Quer dizer, no espaço de um minuto, um jogo brilhante foi transformado numa luta desigual e injusta por exclusiva culpa de um árbitro incompetente.
Se um pai impertinente faz um filho desobediente, que dizer de um árbitro que assim age? Poderemos dizer que a missão de arbitrar é difícil. E é verdade! Em língua, o melhor critério de correcção é o do uso, único válido em todas as circunstâncias, como dizem os melhores gramáticos. No futebol juvenil, com jovens em formação, o melhor critério, além de todas as regras, é o do bom-senso. Que todos sejamos sensatos: em casa, na escola, no campo de futebol. E se somos educadores, que mais sensatos sejamos!

quinta-feira, novembro 20

LINGUAGEM VIOLENTA NO DESPORTO

Enquanto aguardava pelo Brasil-Portugal, assisti ontem a um debate sobre linguagem violenta no noticiário desportivo. Um pai alertou o Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas para uma série de expressões violentas que lera em jornais, do tipo de “ O grupo X era um alvo a abater”, “vingança saborosa” ou “decidiram partir para a humilhação do adversário”. E o Conselho Deontológico lá recomendou exigência ética e deontológica aos jornalistas, o que nem me parece necessário, pois qualquer jornalista, como bem vincou Vítor Serpa, sabe que há linhas que não deve ultrapassar.

A verdade, porém, é que leio todos os dias expressões que me ferem a sensibilidade, e que, se bem (mal) assimiladas pelos jovens desportistas, podem induzir comportamentos errados. Por exemplo, embora perceba a mensagem, choca-me ver os “guerreiros” do Sporting de Braga em cartazes espalhados pela cidade, com armaduras e tudo… Porque o futebol é um desporto nobre, não é terreno de guerra, nem um simples jogo deve ser sentido como uma batalha.

Mais grave, na minha opinião, é a falta de formação de alguns dirigentes, treinadores e árbitros que acompanham o futebol infanto-juvenil. Eu sei que não é fácil construir um edifício de excelente formação desportiva, mas os clubes devem prestar atenção redobrada às características dos formadores, procurando neles uma boa base científica, pedagógica e essencialmente humana. É inaceitável que num jogo de infantis o treinador insulte um árbitro, como é inaceitável que um árbitro não compreenda a índole de um jovem de 9 ou 10 anos, penalizando-o quando deve ensinar. A formação desportiva é uma área demasiado importante para ser deixada ao deus-dará.

quinta-feira, novembro 13

PARA PENSAR

O E. é um jovem de dez anos, muito inteligente e sensível, que gosta de ler e de escrever. Porque lê muito e com prazer, conhece já parte substancial do léxico e usa-o com propriedade. Um destes dias, desenvolveu em casa um tema simples. A mãe, como sempre, ajudou-o numa ou noutra vírgula, mas sem interferir no registo vocabular. Ontem o professor sublinhou-lhe a redacção e disse-lhe: “Estas palavras não foram escritas por ti”. O E. não reagiu, mas sentiu-se injustiçado. Ontem à noite o E. estava calmamente a fazer outra redacção. Escreveu uma palavra mais “difícil”, a mãe achou-a muito bem utilizada no contexto e disse-lhe: “Olha que bem!...”. E incentivou-o. Mas o E. ficou pensativo, cabisbaixo, e disse à mãe: “Não, mãe, é melhor não usar essa palavra, porque o professor não vai acreditar que fui eu que a escrevi”. A mãe ficou estarrecida com a resposta e decidiu ir falar imediatamente com o professor.

Este episódio é verdadeiro e faz-nos pensar. Que parte cabe aos pais na educação (e na instrução) dos seus filhos? Que acção científica e pedagógica deve o professor desenvolver para que não destrua pela raiz a competência e a criatividade de jovens como E.? Porque quando uma criança de dez anos não escreve a palavra X porque o professor não vai gostar, ou porque o professor vai duvidar, então algo está profundamente errado. E o erro não está certamente na criança, que apenas quer exprimir o seu pensamento nas estruturas que lhe são intrínsecas e com as palavras que vai aprendendo.

domingo, outubro 26

NÃO TENHO ALTERNATIVA

Dizem que fazemos a vida, que decidimos sobre ela, que ela é exactamente o que desenhamos nos nossos sonhos mais belos. Talvez seja assim. Talvez alguém consiga construir o castelo do sonho e nele viver eternamente. Não sendo cartesiano, sou no entanto céptico. Que vida “fez” o felizardo do euromilhões? Fê-la até aqui, até ao momento da sorte. Vai continuar a fazê-la? Ou vai deixar-se guiar por ela? Nós fazemos a nossa vida, mas a vida também teima em nos fazer. Dizer, portanto, “eu faço e pronto!” não significa nada sem a assunção do devir. Porque o devir pode ser trágico, quando não cómico. Há, porém, alternativa ao amor? Se eu amo, posso dizer “ Não posso ficar contigo, não tenho alternativa”? Que alternativa é mais importante do que o amor? Os poetas laceram corações quando nos falam desse sentimento que nos explode. E nós choramo-lo. É a dor.

quarta-feira, outubro 15

A CRISE

Como diria o Agostinho, isto é que vai uma crise...O mundo em crise, Portugal em crise, eu em crise?Interessante... Escrevo a palavra, soletro-a e acho-a bonita: "crise", "crise", "crise"... Tem uma sonoridade engraçada, faz-me lembrar os grilos da minha infância... As palavras são assim, bonitas ou feias, quer dizer, elas não têm nenhuma culpa de ser feias... "cri...cri...cri...", isto num poema resultava bem... Como diz alguém naquela imagem batida, que a luz apareça no fundo do túnel. Porque este som grilático, sendo lindo, já me fere a carteira.

sexta-feira, outubro 3

POLÍTICA E ÉTICA

Há momentos na nossa vida em que temos de pensar mais profundamente, em que temos de decidir de forma “política”. Pessoalmente, sempre valorizei mais os actos do que as palavras. Estas são muito bonitas na boca de quem bem fala, ou na pena de quem escreve. A realidade, porém, encarrega-se de nos abrir os olhos, de nos esclarecer, de nos dizer que as palavras podem ser a mentira das acções.

Em política, tenho disto a minha dose. António Guterres, por exemplo, fala muito bem, falava maviosamente quando foi ministro, mas fugiu à primeira dificuldade. Nele votei, mas nunca mais votaria, na hipótese peregrina de que retornasse. Durão Barroso também fala muito bem. Mavioso que se farta. Fugiu de rabo queimado entre as pernas. Alguns dirão que traiu. Nele também não votaria, se entretanto retornasse.

Na política, a ética é basilar. Na minha opinião, nem Guterres nem Barroso foram éticos.

Por isso, sem ser da sua cor partidária, admiro Marques Mendes. E admiro-o porque, em variados momentos, sacrificou algo da sua vida, da sua carreira política, por causa do seu posicionamento ético. Todos se lembram do código de ética por si imposto, código que afastou vários “políticos” de cargos importantes para o PSD. Talvez alguns digam que exagerou, que o partido não ganhou nada com isso. Mentira! Ganhou pelo menos um admirador que sou eu. No Marques Mendes eu passei a confiar. Quem sabe um dia destes voto nele?

domingo, setembro 28

ARGUMENTAVAS...

Argumentavas leve, mas augusta,
Sobre o amor ou sobre a vida vil,
Imploravas sentir o quanto custa
Esmaecer um poema em flóreo Abril.

A leira abria um sulco meio adusto,
O tentilhão trinava em mim pueril,
A natureza que jamais se assusta,
Derramava lágrimas, mais de mil.

Só de ouvir-te, as lágrimas choravam,
O sol, o monte, o mar, todo o esplendor,
Da vida os elementos gotejavam.

Tu sabes muito bem que além da dor,
Além das vãs palavras que clamavam
Tu e os outros, há o divino Amor.

Copyright José Silva, 28.09.2008

segunda-feira, setembro 22

ANDA TUDO MALUCO...

Leio que Bush anda a salvar impérios privados. Pelas Américas, tudo é possível. Por cá, tudo na mesma, como a lesma: consumo em queda permanente, pobreza galopante, natalidade a tender para zero, medidas para alterar a situação inexistentes. Este país é um oásis de nada. Nem os futebóis nos alegram…O Benfica é sempre a mesma tristeza; o Sporting joga sempre com “tranquilidade”, consoante os solavancos do Paulo Bento; o Porto até já empata com o Rio Ave. Em Espanha sobram as bombas. Será que o Obama ganha? Este mundo não anda lá muito bem da cabeça…

terça-feira, setembro 16

MAIS DO MESMO

Levanto-me e leio. Isto é que vai uma crise… Pelas Américas há bancos a falir. Anda tudo com as calças na mão… Portugal continua, impávido e sereno, a pedir esmola na esquina. Os nossos políticos nem se vêem. O Sporting joga hoje com o Barcelona, ganhará? As aulas já arrancaram, pelo menos os putos partiram alegres. A ver vamos.

domingo, setembro 14

PINTURA

Estávamos os dois ali deitados,
Sob a ramagem lenta dos pinheiros.
Dois esquilos sorriam enlevados,
Eram sorrisos puros, verdadeiros.

O sol queimava longe nos eirados,
O céu tremia azul sobre os lameiros,
E nós ali amando-nos calados,
Do mundo éramos únicos, primeiros.

O amor dá sempre a mão à natureza,
Aperta-a contra o peito e sempre implora
A simbiose da dor com a leveza.

Pintura somos nós a toda a hora:
O céu, o sol, a cor e sem surpresa,
A tua boca que florescente aflora.

José Silva, Copyright, 15.09.2008

sábado, setembro 13

CANSAÇOS…

Um dia li Robert Musil e o seu “ O homem sem qualidades”. Musil é um malandro, mas um malandro muito sério. Em determinada passagem, diz que ser feliz cansa tanto como ser infeliz, é tudo questão de contexto e de atitude perante a vida. A verdade é que o ser humano nunca está verdadeiramente feliz com a sua condição, nem porventura quando lhe saem 50 milhões. Ouvi dizer que o amigo de Vila Verde, mais recente vencedor do Euromilhões, é um homem infeliz. Esconde-se, ninguém sabe dele, a sua vida mudou, pelos vistos para bem pior. Que se lixe o dinheiro, dirão. Pelos vistos, ser feliz cansa mais do que ser infeliz. O Musil terá razão?

sexta-feira, setembro 12

A VIDA E A MORTE

A propósito do poder, dizia Kundera que a luta da memória contra o esquecimento é fulcral na vivência humana. A memória, essa coisa relativa ao passado, porque a memória do futuro é impossível. Há pouco, o meu mais velho, filósofo em plena floração, reforçava: “Com a ciência actual, as pessoas podem viver quase eternamente. Podem substituir peças, podem pôr um coração mecânico, um braço articulado, um chip de memória nas memórias idas.”. Fiquei a pensar… A busca do elixir da juventude ultrapassou a ideia e concretiza-se em factos: o homem, hoje, pode efectivamente viver mais. Mas, para quê? Para viver ou para sofrer? E cogito: Tenho a sensação de que à busca da vida eterna se sucederá o desejo obsessivo da morte. Um dia destes, não vamos querer viver, mas desejar inelutavelmente morrer.
CACULO

Quando eu era pequeno, a minha mãe dizia-me muitas vezes: “Precisas de te alimentar bem, come um prato de massa de caculo!”. Porque a língua se transmite de pais para filhos, em variadas sincronias, continuo a dizer ao meu mais novo, jogador de bola e gastador de necessários hidratos e outras calorias: “Tens de comer uma grande pratada, filhote, de caculo!”. Ele vai brincando comigo, diz que tal palavra não existe, e que eu vivo no século XV da língua portuguesa. Até pode ser. As línguas são extraordinariamente dinâmicas, as palavras cabeceiam significados, mas é óptimo que os mais velhos actualizem estas palavras, relevando a riqueza insuperável do léxico da nossa língua. Consulto vários dicionários e nada. Consulto o formidável Houaiss et voilà: “Caculo: em demasia, em excesso, de sobra”. É isso mesmo! Um prato de massa de caculo é um prato cheio, se possível em pirâmide, para saciar a fome e dar energia. A palavra, afinal, ainda existe! Eu que o diga, pois a repito todos os dias…
CUECA

Não, escusam de pestanejar porque não estou a pensar na cueca, pecinha de vestuário a que por aqui chamamos, em altaneiro tom, cuecas, ou cuequinhas, agora reduzidas a um tão débil fio que quase nem se vêem, para bem dos nossos cansadinhos olhos. Estou antes a pensar na rítmica cueca, dança típica do Chile, que ouço neste momento. Linda, parece o malhão… Mas por que carga de água estou a ouvir música chilena, e ainda por cima música popular? Só esta e a da lambada… Estas nossas meninges pregam-nos cada partida…

quarta-feira, setembro 10

SEM TEMPO

Isto hoje está complicado. Nem tempo tenho para ler os jornais… Podia falar do tempo, mas as nuvens parecem sempre as mesmas… Podia falar de futebol, mas Portugal ontem foi uma tristeza… Podia, enfim, falar de política, mas o Baptista-Bastos acaba de dizer que a Manuela Leite parece uma estátua fria… O melhor é não dizer nada. Há momentos em o calado é realmente o melhor.
Interessante: se o particípio de calar é calado – e se eu não falo, escrevo – qual seria o particípio que eu deveria empregar neste momento? Ou este particípio é já adjectivo, e eu deveria estar quieto? Pronto: fico quieto!

terça-feira, setembro 9

MARAVILHA...

Há palavras belas, que nos tocam, que traduzem sentimentos quase inexplicáveis. A palavra maravilha é uma dessas palavras, que uso frequentemente. Em Latim, significava exactamente “coisas admiráveis”, e ganhou estatuto em formas que se fixaram na língua e que são, portanto, de conhecimento e uso geral. Quem não conhece a oitava maravilha do mundo, ou as sete maravilhas do mundo, quando nos referimos aos sete monumentos da antiguidade, ao farol de Alexandria, às pirâmides do Egipto, aos jardins suspensos de Babilónia, ao templo de Diana em Éfeso, à estátua de Zeus em Olímpia, ao mausoléu de Halicarnasso ou ao colosso de Rodes? Ficamos felizes quando as coisas nos correm às mil maravilhas, contamos maravilhas dos nossos filhos, há quem faça maravilhas só com o olhar e, final dos finais, dizemos – como eu digo frequentemente – “Que maravilha!”, como exclamação de entusiasmo, assombro ou encantamento. A vida é realmente uma maravilha. Assim a saibamos sentir e viver, olhando os olhos dos pássaros, sentido bater o coração das águas, amando plenamente quem nos ama.

domingo, setembro 7


PURA MAGIA
As línguas possuem no seu corpo expressões que, nas diversas sincronias, se foram fixando, constituindo um belo acervo cultural. Quem não resolve um problema enquanto o diabo esfrega um olho, ou quem não vai, por vezes e a pé, ao longínquo cu de judas? Estudar a origem destas expressões é da competência da lexicologia, disciplina sem dúvida relevante dos estudos linguísticos.
Ontem alguém me referia a expressão pura magia, também ela em fase de fixação na língua. De pura magia são as realizações de Houdini, os poemas de Pessoa, os livres secos e certeiros de Ronaldo. De pura magia são as ancas da Jennifer Lopez, os olhos rasgados da Zeta-Jones ou os lábios da Angelina Jolie. Mas a magia voga também nas flores, na giesta dos montes, na água límpida dos rios, no chilrear vibrante dos pássaros. Não admira, pois, que o povo cristalize a forma, a use espontaneamente, pretendendo com ela designar estados reais ou de alma muito particulares.
Do que ninguém duvida é da pura magia de um beijo apaixonado, de um olhar fixo e quase infinito, de um acto de amor profundo e verdadeiro. No amor, que é indefinível, tudo se transforma em puríssima e saborosa magia. Amemos, pois, magicamente!

sábado, setembro 6

De Palin a Jardim

Sarah Palin é candidata a vice-presidente dos Estados-Unidos. Ao mesmo tempo, Sarah envia mensagens para a convenção do Partido para a Independência do Alasca. Algo não bate certo nesta posição. John Mccain deve cuidar-se. Em Portugal, houve (e há?) movimentos independentistas, com jardins resplandecentes de alusões e de ironias. Há tempos, alguém sugeriu: Jardim à presidência de Portugal! Eu acho bem. Nesta pasmaceira escura, bem precisados andamos de canteiros floridos e de silvas ao vento. Mas que não haja confusões: no Alasca, que haja lasca! Na Madeira, que o gorgulho não viceje.

sexta-feira, setembro 5

ANGOLA

Procuro informação sobre Angola. Sei que decorrem eleições legislativas, sei que a comunidade internacional se preocupa com elas, e também sei que o governo angolano rastreia cuidadosamente a cobertura jornalística. Leio Angola News e, para além de não vislumbrar uma única palavra em português, zero sobre as legislativas. Leio Angola Press: informação cuidada (demasiado cuidada?). Consulto a Angola Digital. Grande título: Eduardo dos Santos: um Maquiavel moderno no comando de Angola há 29 anos. A guerra acabou, Angola renasce das cinzas. O crescimento actual parece forte e tudo aponta para mais uma vitória de Eduardo dos Santos. Que Angola saiba encontrar o seu caminho, em paz e com grande progresso, é o desejo de todos os irmãos portugueses.

quinta-feira, setembro 4

REQUINTE

Nunca me tinha apercebido disso. Estudar a língua é uma coisa, estudar as mulheres é outra, bem diferente. Mas ela disse-me: “As mulheres do sul são mais requintadas que as do norte”. Porque as mulheres do sul são mais aprimoradas no porte e na linguagem. Fiquei a pensar. Será verdade? Não conheço muitas mulheres do sul, mas a verdade é que cá as minhas conterrâneas abusam um pouquinho do palavrão. Claro que não são todas, há-as bem polidas e com algum verniz nos neurónios. Mas aquela do requinte, do primor, da quinta-essência comportamental deixou-me de lado. Porque a ideia que tenho é de que as mulheres são todas bonitas, e a de que a beleza é uma resultante também da linguagem. É feia uma loiraça que diz um palavrão? Depende do contexto… Depende do contexto…

quarta-feira, setembro 3

E AS FÉRIAS JÁ LÁ VÃO...

Voltei. As férias terminaram; o sol este ano esteve envergonhado; os pingos de chuva já amaciam a pele. E cá vamos para mais um ano de trabalho. Só espero que valha a pena, e que não nos torçam o nariz em horas de lua nova.

domingo, maio 25

Foto: ebrunet

O GROVE, A TOXA E O PORTUGUÊS DA GALIZA

Sou nortenho de Portugal. Adoro a Galiza.

Sempre que posso, visito a Galiza. Conheço-a muito bem, tal como conheço muito bem o norte de Portugal. Aliás, o norte de Portugal e a Galiza conformam a mesma nação: o mesmo sentir, o mesmo coração, a mesma língua. Quando me inebrio com os poemas de Rosalía de Castro, ou com as cantigas de Martim Codax, inebrio-me como um telurismo que faz de mim um galego e de um galego um português.

Um dia, estava eu em A Toxa, ali por O Grove, quando ouvi, em português retinto, uma velhota apregoando “Quem quer castanhas…”. Olhei e sorri. Não fiquei nada admirado, pois sabia que os galegos mais idosos falam português, pois em português nasceram e em português hão-de morrer.

Há dias ocorreu em Santiago uma grande manifestação a favor do galego como variante do português. Eu sei, porque tenho participado na coisa, que há galegos a serem punidos por defenderem esta posição, seja nas escolas, seja na própria sociedade. E não me parece bem que os diversos governos de Espanha tentem, a todo o custo, impor o castelhano, impedindo o livre florescimento das outras línguas oficiais.

Por muito que o centralismo queira impor unicidades linguísticas, a consciência de que a língua faz a nação nunca deixará que tal facto aconteça.

Historicamente, o galego é o português e o português é o galego. A língua portuguesa fala-se em Portugal, no Brasil, em países africanos e até asiáticos. Fala-se também na Galiza. É uma língua de enorme prestígio e só temos de dar as mãos para torná-la cada vez mais prestigiada em todas as instâncias internacionais.

Em Portugal, vemos televisão espanhola. Os portugueses são universalistas e não têm barreiras psicológicas nem políticas. Porque não poderiam ver televisão espanhola? Mas os galegos não vêem televisão portuguesa. O que é um insulto, não só aos galegos, mas também aos portugueses. E não vêem porque os políticos não deixam.

Afinal, quem tem medo de quem? Os políticos espanhóis têm medo que os galegos mais jovens descubram que a sua língua materna é, imagine-se, falada por mais de duzentos milhões de habitantes?

Apaixonemo-nos pela Galiza, que é do nosso corpo e sangue.

sexta-feira, maio 16

E A RESPOSTA É...


Existe, na língua portuguesa, um verbo muito curioso e raramente usado. Digamos que ele é geralmente reconhecido pela forma participial que, como bem sabemos, assume bastas vezes função adjectival. O significado de ENSIMESMADO é facilmente reconhecível em frases como:

a)Ultimamente, a nossa ministra da Educação anda um pouco ensimesmada. Porque será?

O verbo ensimesmar-se é verbo pronominal, com a particularidade de sê-lo duplamente em forma reflexa. Reparem:

Eu em mim mesmo-me
Tu em ti mesmas -te
Ele em si mesma-se
Nós em nós mesmamo(s) –nos
Vós em vós mesmais –vos
Eles em si mesmam-se

Juntando tudo:

Eu emmimmesmo-me
Tu entimesmas -te
Ele ensimesma-se
Nós ennosmesmamo–nos
Vós envosmesmais –vos
Eles ensimesmam-se

E pronto, cá está o Presente do Indicativo do verbo ensimesmar-se.

A resposta ao exercício seria então, tal como disse o Sotero no Fórum de Numismática, emmimmesmo-me.

quinta-feira, maio 15

UMA AJUDINHA...

O verbo, no Infinitivo Impessoal, e segundo o Dicionário da Academia, significa "Ficar pensativo, em atitude de meditação e interioridade, abastraindo-se do que o cerca". É uma boa ajuda...

terça-feira, maio 13

UM PRÉMIO A QUEM ACERTAR

Há, na língua portuguesa, um verbo pronominal que, numa das pessoas do Presente do Indicativo, tem SEIS M. Qual é?

Uma moeda de prémio a quem der aqui a resposta certa (moeda à minha escolha).

Presumo que não será muito fácil encontrar a resposta, mas como exercício serve.

quinta-feira, maio 8

BARBUDA, GRAVE E PILARTE

Quando ElRey D. Fernando fez a guerra a Castella, serviraõ a ElRey D. Henrique o Nobre muitos Soldados Francezes, que vinhaõ armados de celadas, a que eles chamavaõ Barbudas; e traziaõ lanças com pendoens, que chamavaõ Graves; e traziaõ comsigo pagens para as celadas, a que chamavaõ Pilartes; e querendo Elrey D. Fernando deixar memoria d’esta sua empreza, poz estes nomes, e insígnias nas Moedas, que mandou lavrar de novo.

D. António Caetano de Sousa, História Genealógica da Casa Real Portuguesa


Barbuda

Grave

Pilarte

Fotos: Fitzwilliam Museum/ Luís Norte

quarta-feira, abril 2

ACREDITO NOS PORTUGUESES!
O Firmino, meu amigo e meu aluno, escreveu este texto. Está muito bem escrito, tem ideias claras e apresenta uma visão muito positiva de Portugal e dos portugueses. Dou-lhe os parabéns e incentivo-o a escrever cada vez mais.

A Globalização é um fenómeno que afecta, praticamente, todos os países ocidentais, embora com diferentes graus de influência, consoante a sua localização geográfica, o acolhimento que as populações dão ao que lhes chega de fora a quase toda a hora e, em termos mais específicos, ao maior ou menor proteccionismo que os estados utilizam como meio para salvaguardar a actividade económica doméstica.

O contínuo alastramento desta realidade vem provocando mudanças no quotidiano das nações, que não seriam previsíveis há alguns anos atrás. A livre circulação de pessoas e bens originou uma transformação, quase radical, nas economias dos países levando a ajustamentos com que muitos não contariam. A mobilidade em termos de emprego será uma das faces mais visíveis dessa realidade. A procura de um emprego estável e duradoiro, não raras vezes para toda a vida, que era apanágio do nosso país, vai sendo substituído por uma mobilidade estranha a essa anterior realidade, hoje encarada como normal e, até, em alguns casos, incentivada. Simultaneamente, é possível observar a chegada de imigrantes das mais variadas nacionalidades, o que parece ameaçar a força laboral indígena, já de si debilitada pelas altas taxas de desempregados. A par com esta realidade, as repercussões em termos de indústria e comércio internos, derivadas da proliferação da entrada de produtos oriundos de países com mão-de-obra mais barata, onde as exigências em termos de protecção social são quase inexistentes, e onde, em boa verdade, não se observam limitações ao volume de carga horária laboral, provocando uma sensação desagradável de concorrência desleal, vai também minando a confiança dos agentes económicos e da população.

Mas, um país com uma história de mais de 900 anos, terá que se resignar a essa visão negativa e redutora deste fenómeno? Não seremos nós capazes de dar a volta por cima, como já tantas vezes fizemos? Claro que sim. Aliás, já é hoje possível encontrar jovens licenciados portugueses a dar cartas fora do país. À falta de oportunidades de desenvolverem as suas capacidades dentro de portas, é vê-los a desbravarem caminho em países que apostam neles, crentes das suas capacidades e competência, sabendo que a aposta não será em vão. Eles representam uma nova casta de emigrantes, não de mala de cartão na mão, mas sim de “canudo” em riste, prontos a encararem novos desafios, conscientes do seu valor e sem medo de enfrentarem a concorrência dos nativos desses países. Em termos económicos temos também o exemplo da indústria do calçado, que tem vindo, ano após ano, lenta mas seguramente, a consolidar-se como uma das que mais qualidade apresenta e, fruto dessa competência, a aumentar a sua penetração nos mercados internacionais e a exportar mais a cada ano.

Mesmo em termos históricos e culturais não creio que tenhamos muito a recear. Temos uma história das mais ricas, de que todos nos orgulhamos e de que muito poucos outros se podem vangloriar. No campo cultural também não devemos temer que as influências externas nos “colonizem”. Desde monumentos, a diversos locais classificados como património da humanidade pelo seu significado histórico-cultural, passando pelos enormes vultos da nossa literatura, de que muito poucos poderão ufanar-se, temos uma riqueza incomparável, da qual só podemos ter “vaidade”.

Concluindo: apesar do que muitos profetas da desgraça vaticinam em termos de futuro para o nosso país, creio que temos todas as razões para não alinharmos ao lado dos pessimistas que nada esperam de positivo. Um povo com uma história tão grandiosa, que já enfrentou desafios maiores e foi capaz de os dobrar, não será agora que irá capitular. Acredito, verdadeiramente, nos portugueses.

Firmino Joaquim Silva Cardoso

quarta-feira, fevereiro 13

DERIVAÇÃO IMPRÓPRIA

Azul adjectivo a coisa
Traço que vejo ou nego
O azul.

Ao longe o nome avermelha.

Plena substância
A unidade designa
Algarismo indefinido
No contexto.

Se o comer se deita fora
Não se come
Não age se designa.

Movimento no sintagma
Cuide-se a gramática
E descanse.

No sonho o azul esvoaça
Azul.

Constrói ninhos invisíveis
Na categoria imperfeita.

José Silva, 13.02.2008

quarta-feira, janeiro 30

AS VELHAS ÁRVORES

Olha estas velhas árvores, — mais belas,
Do que as árvores mais moças, mais amigas,
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas . . .

O homem, a fera e o insecto à sombra delas
Vivem livres de fomes e fadigas;
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E alegria das aves tagarelas . . .

Não choremos jamais a mocidade!
Envelheçamos rindo! envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem,

Na glória da alegria e da bondade
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!

Olavo Bilac

quinta-feira, janeiro 17

REPUGNANTE

É adjectivo, e rasga que se farta. O Baptista-Bastos usa-o, e quando o usa afia o monóculo do Eça: “As afrontosas injustiças sociais conduzem as pessoas a um cada vez maior afastamento do acto cívico e ao desprezo repugnante pelos políticos”. Parece que Henrique Granadeiro, administrador da Telecom, aufere mensalmente 185 590 euros. Leram bem, mensalmente. Ao que consta, temos uma classe de gestores e de políticos absolutamente iluminados que, enquanto chutam as empresas e o país para os cueiros da Europa, se entretêm a enxamear os bolsos de aveludados euros. Enquanto tal, o pobre esperneia, saciando a fome em miseráveis cêntimos. É afrontoso, revoltante, repugnante. O Baptista tem razão: este país precisa de um valente coice. Dos burros. Ou dos camelos.

segunda-feira, janeiro 14

LIBERAIS DE PACOTILHA

E Pedro Magalhães disse que os colunistas andam irritados. Motivo: a crescente regulação dos comportamentos individuais pelo Estado. E Vasco Pulido Valente respondeu-lhe. O Pedro merecia, o Vasco, pelos vistos, também. Os argumentos são os costumeiros: ameaças à cultura e à tradição; atentados à liberdade individual; falta de educação e inevitabilidade dos comportamentos. O Pedro, nas meias tintas, coercivo. O Vasco, não sei se nas meias se nas umas, abrasivo. Isto só vai mesmo é a chicote, diz o Pedro. Eu acho que tem razão, se pendurado nas nuvens.