quinta-feira, maio 24

O prefixo ANTI

O prefixo é o elemento da palavra, um afixo, que vem antes da raiz (semantema), e tem origem, em geral, em advérbios ou preposições que têm ou tiveram vida autónoma. Há-os de origem grega e latina, e não poucas vezes causam uma grande confusão, provocada, essencialmente, por factores psicológicos de analogia. O prefixo anti é um desses elementos, e não é fácil sistematizar o seu uso. De um modo simples, porém, podemos dizer que tal prefixo:

a) se junta a todas as consoantes: anticorpo, antigripal
b) excepto às consoantes h, r e s : anti-histamínico, anti-romanismo, anti-semita,
c) e à vogal i : anti-inflamatório.

O significado geral é o de oposição, ou acção contrária.
Não é fácil interiorizar as excepções e jogá-las com a regra. É fácil pensar: se escrevo anti-inflamatório com hífen, antialérgico também deve levar hífen. Errado. Se escrevo anti-semita, porquê anticorpo? Pois é, não há nada como estudar, fixar, sistematizar. Saber Português obriga a saber estas pequeninas coisas...

quarta-feira, maio 23

CARAGO NON... CARAGO!...

No nosso dia-a-dia, de acordo com as múltiplas circunstâncias em que nos movemos, dificilmente usamos um registo de língua uniforme, nem ele existe, como é fácil de ver. Podemos, claro, falar cuidadosamente, com estruturas e palavras “elevadas”, numa conferência de linguística, numa aula de Português, ou, até, numa mesa de café. No entanto, parece evidente que, se participamos num jogo amigável de futebol, o registo desce ligeiramente, e não raras vezes se ouve uma carvalhada acrescida de uma sonora gargalhada. Quer dizer, usamos diversos registos em diversos momentos consoante as circunstâncias, e, se o intuito não for clara e inequivocamente ofensivo, ninguém levará a mal tais carvalhadas. Aliás, expressões consideradas ofensivas, como caralho, ou filho da puta, podem perfeitamente ser usadas com valoração bem positiva. Por exemplo, e neguem-no, se forem capazes, quando vejo Cristiano Ronaldo a torcer os olhos aos defesas e digo Que filho da puta de jogador! Extraordinário…, faço-o com profunda admiração, e nunca com sentido pejorativo.
Vem isto a propósito de uma senhora directora da DREN que decidiu suspender um professor destacado pelo simples facto de ele ter usado a expressão filho da puta num contexto qualquer que não foi especificado ( expressão que, aliás, o professor nega ter usado). E tudo porque, na sua opinião, ofendeu o primeiro-ministro que, ao que parece, é um ser celestial, profundamente angélico e que, durante a sua eremítica vida, nunca deve ter proferido nem uma singelinha carvalhada. Ora, ao que se vislumbra, descobrimos de repente estar o nosso país em fase purgatória, sob os auspícios de angélicos e linguisticamente imaculados dirigentes que, no seu afã de protecção de tachos e panelas, genuflectem perante sábios, eremitas e, pasme-se, até filósofos. Percebe-se a emergência de uma censura que pensávamos a milhas, lá longe, no alto mar. Pelos vistos, as censuras e os censores andem por aí, como diz o zé povinho. Ora bolas: por este caminho, noventa e nove por cento dos portugueses vão ser sujeitos a processo disciplinar por excesso de linguagem. Entom a malta do Puerto, carago… (será que posso dizer carago se o nosso Sócrates me der mais um encontrão? Hmmm… tenho de pensar bem nisso, não vá o diabo tecê-las…).

segunda-feira, maio 21

EUA tentam impedir G8 de impulsionar novo acordo sobre aquecimento global
21.05.2007 – 20h 08m Reuters

É a lei da proporção progressiva: no princípio eram só balas, e lá se foi o índio; nos intermédios eram só bombas, e lá se foram uns, e lá se foram outros; no final de contas, isto é G8 ou é G3? Baixem mas é a bolinha se não ainda disparo umas rajadas que vos lixo...

sábado, maio 19

OS TRÊS

O três é um numeral cardinal, com marca masculina e singular. Quando, no entanto, se ouve a expressão popular os três, plural, remete-se imediatamente para o âmbito sexual. Perder os três significa perder a virgindade. Se procurarmos, porém, o significado de três num qualquer dicionário, dificilmente encontraremos referências que ultrapassem o âmbito numeral. Deixemos a vista alongar-se pelos verbetes relativos a este algarismo e, lá mais para a frente, encontramos o verbete três-vinténs. É isso: quando se fala dos três, fala-se dos três-vinténs. Ora, o vintém é uma moeda, com primeiro curso em D. Manuel I, e os três-vinténs devem corresponder ao meio tostão (50 reais) acrescido de mais dez que, por artes inflacionistas, foram acrescidos ao valor inicial. O tostão media aproximadamente 20 milímetros ( notem bem, 20 milímetros!) de diâmetro. Ora, parece que lá para o norte de África havia o hábito de confirmar a virgindade das donzelas exactamente com uma moeda, que teria mais ou menos o tamanho do hímen. A donzela ganhava ou perdia os três vinténs, consoante fosse virgem ou não. Por metonímia, a expressão deve ter voado de lá para cá, e por isso há quem perca os três. A explicação é interessante e lógica. Mas… exactamente 20 milímetros....?

quarta-feira, maio 16

POIS...

Não, não se trata da princesse aux petits pois, nem do pois chice de que gosto tanto com bacalhau cozido em molho de tomate. Trata-se deste pois, tão eclético em português, que usamos com valorações causais ou conclusivas, e que, em contextos muito específicos, nos deixam torcendo uzolhos ou arrepiando ujdedos. Disse-lhe que não podia ser, que as circunstâncias não o permitiam. Não me disse nada, apenas gorgolejou: Pois… E fechou muito os lábios. Eu percebi-a. Este pois é profundo, e vale novecentas e noventa e nove palavras.

domingo, maio 13

De http://foto-diario.blogspot.com

PUDOR ET VERECUNDIA
Leio « Pudor et Verecundia": deux formes de la conscience morale? de Jean-François Thomas. Penso na origem das palavras, na evolução semântica, na polissemia evidente, na pretensa sinonímia. Pudor: escrúpulo, timidez, modéstia, sentimento de honra ou honorabilidade. Também verecundia>vergonha: sentimento de honra, escrúpulo, timidez, modéstia. Comparo as palavras e parecem-me sinónimos perfeitos. Serão, no entanto, duas formas da nossa consciência moral? Os nossos jovens de calças pelos pés e de cuecas à mostra são despudorados ou desavergonhados? E os nossos políticos, os nossos jardins sem bananeiras visíveis, são sem-vergonha ou sem-pudor? Ora cá está um tema interessante! Ofereço-o a quem queira aprofundá-lo.

quinta-feira, maio 10

ATITUDES

Anteontem fui a um banco depositar uns valores. Quando verifiquei a caderneta voilà um erro: menos 600 euros. Chamei a atenção do empregado que me pediu desculpa e acertou a coisa. Ontem fui ao mesmo banco depositar uns cheques. Quando verifiquei a caderneta, faltavam 1200 euros. Chamei a atenção do empregado ( não era o mesmo) que me pediu desculpa e acertou também a coisa. De manhã, em Guimarães, paguei um café com 5 euros. Recebi de troco 2,5 euros. Chamei a atenção do empregado que me pediu desculpa e acertou a coisa. Ontem à tardinha, na esplanada do Bom-Jesus, paguei dois cafés e umas águas com 20 euros. Recebi de troco 2,80 euros. Chamei a atenção do empregado que me pediu desculpa e acertou a coisa. Acreditem que não estou a inventar, é mesmo verdade! Das duas uma: ou esta gente é muito distraída, ou só sabe somar para baixo e tem de voltar à escola, ou os portugueses são visceralmente corruptos, e não há nada a fazer. Pela minha parte, prometo-me verificar todos os trocos, todos os pagamentos ao milímetro. Porque já sei: a mais nunca receberei um cêntimo; mas é provável que de cinco em cinco minutos me dêem a menos uma caterva deles. Enfim, quem me avisa, meu amigo é... E eu estou a avisar-me.

sábado, maio 5

ROR

Lê-se a palavra. Não, não é rol, é mesmo ror. Mas esta palavra usa-se? Perguntei a uns trinta alunos: ninguém a conhecia. Acrescentei-lhe a preposição de: ror de. Na mesma, como a lesma. Incluí-a numa frase: No S. João estava um ror de gente. Aaaahhh… Agora sim, abriram a boca de espanto. Nunca ouviram ou leram a palavra ou a locução. Mas descobriram o sentido. Interessantes, os mecanismos linguísticos: No S. João estava muita gente. O que poucos sabem é que ror é uma redução de horror: No S. João estava um horror de gente. Costuma estar, desde que não chova.