quinta-feira, fevereiro 26

SEQUÊNCIAS CONSONÂNTICAS

A propósito de sequências consonânticas (Base IV do Acordo Ortográfico), estou a interiorizar a forma como, doravante, vou escrever algumas palavras. Algumas, bem comuns, são as seguintes:

a) Convicção, convicto, ficção, pacto, adepto, apto, eucalipto, núpcias, rapto…
b) Ação, coleção, direção, adoção, ótimo…
c) Facto, setor, conceção, corrupto, receção…
d) Assunção, perentório, suntuoso…

Acho que vou escrevê-las assim, porque assim as pronuncio. Mas que isto vai ser complicado, lá isso vai… E vai demorar algum tempo…
ÍNDICES DE CONFIANÇA NO FUNDO

É geral: os índices de confiança de empresários e consumidores estão em mínimos de sempre em todo o mundo. E isso, parecendo mau, até é bom. Significa que estamos no fundo de uma crise sem precedentes e que, a partir de agora, o caminho é o da recuperação. Talvez andemos uns tempos neste fundo, com a economia a receber o impacto da estupidez financeira, mas a recuperação virá. E eu quero estar no centro dela.

quarta-feira, fevereiro 25

À PINHA

Não, não há pinha nos pinheiros, pelo menos nos pinheiros mansos. Parece que alguém se entretém a cortá-las ainda em flor, de modo que… nem vê-las. Por acaso, sou maluco por pinhões, no Natal entretenho-me a descascá-los, gosto do sabor a queimado. Um dia destes, o Rui falou-me de outras pinhas, uma fruta tipo anona, que lhe deram no Brasil. Gostou, e aprendeu o nome da coisa. Nos lados mais marisqueiros, as pinhas podem ser de bivalves e congéneres, tipo mexilhão ou percebes. E como o Zé é um grande mexilhão, a pinha também pode ser de Zés, ou claramente de gente. Se os Zés se acarneiram em magotes, formam uma enormíssima pinha. E se estão no Campo-da-Vinha, este fica à pinha, com os Zés encavalitados uns nos outros. A maioria das vezes, os carneiritos têm areia a mais na moleira, e sofrem da pinha, ficam com ela completamente desregulada. No limite, quando isso acontece, podem até comer a pinha a alguém, enganá-lo, intencionalmente ou não. Conclusão: isto de pinhas é como diz a Aninhas: ou te tratas ou definhas.

Retomado de Metakrítica

quinta-feira, fevereiro 19

HOW WE DECIDE

Cesário verde só escreveu um livro, justamente intitulado O livro de Cesário Verde. O que mais se evidencia na sua poesia é o contraste profundo entre o campo e a cidade. O campo, apresentado como puro e simples; a cidade, apresentada como dura e difícil, à luz moderna do gás. É parcialmente verdade que a cidade tem sido um motor da vida intelectual e da arte. Mas o campo? Mas Camilo? O campo faz-nos desfrutar a natureza, faz-nos respirar o ar puro, faz-nos recordar segundo a segundo as flores e os pássaros, a água cristalina dos riachos, o cheiro a erva dos prados molhados. A cidade, por seu lado, obriga-nos a correr, a cerrar cortinas, a trancar as portas, a mirrar de stresse. Será a cidade uma assassina da nossa memória e das nossas emoções, desta máquina limitada que se chama mente ( Marc Berman)? Por que razão temos uma necessidade urgente de pôr plantas em casa, ou parques arborizados nas cidades? Se as cidades contribuem definitivamente para a perda do nosso controlo emocional, porque não fazer como a Lídia de Pessoa, beijando-nos puros à beira do rio?

A ciência neurobiológica atual vem pondo em relevo a importância da emoção, contrabalançando-a à razão. O paradigma cartesiano vem sendo problematizado (ver Damásio, por exemplo) e discutem-se, hoje, fatores ainda há bem pouco tempo depreciados.

How we decide é um livro muito recente de Jonah Lehrer, muito interessante e continuador desta nova via interrogativa: o que é a emoção, como decidimos e que fatores contribuem para as nossas inopinadas decisões. Para ler rapidamente.

quarta-feira, fevereiro 18

ACORDO ORTOGRÁFICO

Pois é, lá terei de realizar pequenas mudanças na forma de grafar as palavras. Nada de grave, suponho, o que custa é começar. E eu começo hoje e aqui. Porque aqui ninguém me bate, mesmo que “erre” de vez em quando. Porque já sei que vou errar.

Comecemos então a recapitular:
A Base II do Acordo, relativa ao h inicial e final, traz algo de novo? Hmmm… Parece que não. Por força da etimologia, continua a escrever-se onde se escrevia: haver, hélice, hoje, hora…; em virtude da adoção convencional, continua-se com o hã?, hem?, hum!; suprime-se, como se suprimia (partindo-se da etimologia), em erva (em vez de herva), etc. Nada de novo. Suprime-se ainda, como se suprimia, nos casos de composição interna: desarmonia, desumano… Mantém-se, como se mantinha, em palavras compostas como pré-história, sobre-humano…O h final continua a empregar-se em interjeições como ah!, oh!...

Conclusão: tudo como dantes, quartel general em Abrantes.


Nota: Reparo que escrevi a palavra "adoção" em vez de "adopção". Custou muito? Nem por isso...

terça-feira, fevereiro 17

SESTÉRCIO DE ADRIANO


Coleccionar moedinhas pode ser barato, ou não. Depende do que coleccionamos. Há grandes coleccionadores de moedas romanas que, por vezes, perdem a cabeça. Este sestércio de Adriano custou a módica quantia de 2 milhões de francos suiços. É a moeda antiga mais cara de sempre. Mas é linda, não é?

Foto de: www.sacra-moneta.com

segunda-feira, fevereiro 16

A pose

Gosto de ler o Jornal de Negócios. Também pelos negócios, mas fundamentalmente pela pose. Estou aqui entretido a ler o Baptista-Bastos, já todos sabemos que escreve muito, e bem, mas o que impressiona é a pose: laçarote à maneira, leve mão no queixo com sorriso à moda de Lisboa, um must. Ao lado, o Fernando Braga de Matos, o da bolsa. Ar malandreco q.b., sorriso aproximadamente médio, dedo espetado na têmpora direita. De mãos no queixo e pose taciturna, o Fernando Sobral. E vão três de mãos no queixo. Ah, ali também o João Cândido da Silva: asas do nariz inclinadas à direita, mãos no queixo circunspectas. E pronto. O que está a dar é a pose. Não se esqueçam: ponham a mão no queixo, experimentem um sorriso e esqueçam a escrita. Quem quer saber de ideias neste rectângulo mal amanhado?

domingo, fevereiro 15

QUE NOSSA SENHORA NOS PERDOE!

Fiquei curioso. Não-te-metas-na-minha-vida é longa e curiosa designação para planta ou flor, e prova esta relação quase indissolúvel entre as nossas emoções e a natureza que as pressente. Na minha busca de outros nomes curiosos, de plantas ou flores, encontrei o choramingas não-me-deixes. Lembrei-me imediatamente daqueles versos do Gonçalves Dias, que dizem assim:

Debruçada nas águas dum regato
A flor dizia em vão
À corrente, onde bela se mirava...
"Ai, não me deixes, não!"

Onde terá o miosótis ganho cidadania como não-me-deixes? Na pena do poeta? Ou terá o poeta jogado este jogo entre a coisa e a sua denominação popular? Porque o povo tem-nas boas, ora é o não-me-deixes, ora o não-me-esqueças, ora ainda o não-me-toques, ora, no limite, o não-te-esqueças-de-mim. Claro que foi o povo, não o erudito, que nomeou as flores. A flor é de Abril ou é de Maio, é de esperança, é de amor ou de paixão. A de lis é também a da verdade. A flor-da-noite traz consigo uma alvorada. A viuvinha, essa, é a flor-de-viúva sorrindo à nova vida. Mas a melhor, a que me deixa mesmo derretido pela abrangência da significação é, sem a mínima dúvida, a flor-de-babado-de-nossa-senhora. Que a Senhora compreenda, e nos perdoe todos os pecados, inclusive o da nomeação.

sexta-feira, fevereiro 13

O NOME DAS FLORES

Hoje a Bela deu-me uma lição toda floral. Eu já sabia que nomear a natureza requer imensa sabedoria, há tantas árvores, tantas flores, que até me sinto envergonhado por desconhecê-las. Quer dizer, eu sei o que é uma tília, tenho-a mesmo em frente do nariz, dá muita sombra nos dias de canícula; também sei o que é um castanheiro, como dele as castanhas, a minha mobília é de castanho, podia ser de vinhático, mas não é. E até sei mais alguns nomes, mas perante elas, quando as vejo e quero identificá-las, saltam-me as meninges, sou analfabeto, alguém falhou na formação e fui com certeza eu. A Bela, pois, falou-me das arrudas. Eu conhecia o nome, mas nunca a vira. Que cheira mal, diz ela. Eu não achei. Tem um cheiro forte, mas não desagradável. Que espanta o mau-olhado. E parece ser verdade, pelo menos os antigos já lhe atribuíam esse condão. Outros querem-na afrodisíaca. Eles lá sabem. Mas quando me falou nos olhos-de-freira, nos pica-narizes ou nas cristas-de-galo, juro que descambei. Eu de flores sei as rosas e os cravos, os contáveis mal-me-queres e, em excepcional extremo, os brincos-de-princesa ou as alegria-no-lar, todas elas flores bem jardináticas e nada dadas a grandes interiores. O que eu não esperava da Belita era um não-te-metas-na-minha-vida. Olhei bem de soslaio para os seus ondulantes cabelos, franzi-lhe uma bochecha, e só ao fim de sorumbáticos segundos percebi que designava uma ervita qualquer. E eu na minha ignorância: isso são designações bem regionais, na minha terra nunca ouvi falar disso. A minha terra, ali ao lado, uma centena de metros, duas centenas talvez…

Retomado de Metakrítica.

quinta-feira, fevereiro 12

VIVA O SOL!

Hoje o sol abriu.

No jardim em frente abriu também a rosa.

Para o lixo com o pessimismo! Viva o sol e viva a rosa!

quarta-feira, fevereiro 11


FOTOS DE MIGUEL MEALHA

Procurava ligações sobre a palavra mealha. Encontrei esta página, absolutamente extraordinária, e não resisto a referi-la aqui. Miguel Mealha é um grandíssimo fotógrafo. Digo eu, que não pesco nada da coisa, mas que vou tendo algum olho estético.

Miguel Mealha, em: http://photo.net/photos/Mealha
DESCULPA

Certo aforismo, não sei se português, diz que é nosso verdadeiro amigo quem nada nos desculpa, mas tudo nos perdoa. Nas minhas horas mais libertas, tenho pensado muito nisso. Creio que todos temos amigos, daqueles denominados do peito, que, de quando em vez, nos pedem desculpa. Eles sabem bem porquê, mas a verdade é que o pedido de desculpas vai-se repetindo, e repetindo, sem que a origem dela desmaie, ou definitivamente se apague. Quem pede sistematicamente desculpa deve ter a consciência permanentemente pesada. Imagino que deve sofrer. Por isso, porque somos verdadeiros amigos, nós não desculpamos. Que valor teria, em tal contexto, a nossa desculpa? É preferível o perdão. Torna-nos maiores.

Uma pergunta apenas: quem perdoa também sofre, ou o acto de perdoar apaga de forma inelutável todo o sofrimento?

domingo, fevereiro 8

A propósito de omeletes

Diz o povo, na sua profundíssima sabedoria, que é impossível fazer omeletes sem ovos. Eu, como sou povo, também acho. Nos tempos que correm, as omeletes são um produto difícil de conseguir, razão por que os ovos quase se tornaram desnecessários. Por exemplo: a omelete que se chama Educação. Serão os ovos - isto é, os professores - necessários, ou o Estado pode prescindir deles, atirando-os para o caixote do lixo? Pelos vistos, pode. Os bons ovos até ganharam asas e fugiram, não vá alguém aproveitá-los para gemar as criancinhas... E a omelete Economia? Serão os ovos - isto é, as empresas, os trabalhadores - também necessários? Pelos vistos não: está tudo no desemprego, as empresas estão a falir... Está visto: de omeletes não vamos lá. A não ser... ora deixa lá ver... a não ser nas relações. Como dizia a Norinha, isto nem é carne nem é peixe, omelete de certeza que não é, pois nesse caso os ovos éramos nós. Pela parte que me toca, nego-me a ser ovo: de novo, digo eu.