terça-feira, julho 26

NÓS NÃO SOMOS...

Nós não somos a Grécia – disse o ministro irlandês.
Nós não somos a Irlanda – disse o ministro português.
Nós não somos Portugal – disse o ministro espanhol.
Nós não somos a Espanha – disse o ministro italiano.
Nós não somos Portugal – disse Obama.

Eureka: existe um “verbo” NÃO SER! Será conjugável em todas as línguas?


quinta-feira, julho 7

JURAM AS ÁGUAS

E juram que absorto
Estava ali sentado
Entre nimbos e ramos
E todos os silêncios.

Juram as águas que chorando o viram.

José Silva, 07.07.2011


sábado, julho 2

DEVO À PAISAGEM

Devo à paisagem as poucas alegrias que tive no mundo. Os homens só me deram tristezas. Ou eu nunca os entendi, ou eles nunca me entenderam. Até os mais próximos, os mais amigos, me cravaram na hora própria um espinho envenenado no coração. A terra, com os seus vestidos e as suas pregas, essa foi sempre generosa. É claro que nunca um panorama me interessou como gargarejo. É mesmo um favor que peço ao destino: que me poupe à degradação das habituais paneladas de prosa, a descrever de cor caminhos e florestas. As dobras, e as cores do chão onde firmo os pés, foram sempre no meu espírito coisas sagradas e íntimas como o amor. Falar duma encosta coberta de neve sem ter a alma branca também, retratar uma folha sem tremer como ela, olhar um abismo sem fundura nos olhos, é para mim o mesmo que gostar sem língua, ou cantar sem voz. Vivo a natureza integrado nela. De tal modo, que chego a sentir-me, em certas ocasiões, pedra, orvalho, flor ou nevoeiro. Nenhum outro espectáculo me dá semelhante plenitude e cria no meu espírito um sentido tão acabado do perfeito e do eterno. Bem sei que há gente que encontra o mesmo universo no jogo dum músculo ou na linha dum perfil. Lá está o exemplo de Miguel Angelo a demonstrá-lo. Mas eu, não. Eu declaro aqui a estas fundas e agrestes rugas de Portugal que nunca vi nada mais puro, mais gracioso, mais belo, do que um tufo de relva que fui encontrar um dia no alto das penedias da Calcedónia, no Gerez. Roma, Paris, Florença, Beethoven, Cervantes, Shakespeare... Palavra, que não troco por tudo isso o rasgão mais humilde da tua estamenha, Mãe!

Miguel Torga, in "Diário (1942)"


sexta-feira, julho 1

PORTUGAL, PARA ONDE VAIS?

Não tenho por costume fazer análise política, para isso há os politólogos, mas sou um cidadão português que sente na pele tudo o que acontece no nosso martirizado país. O nosso primeiro-ministro já veio dizer que o equivalente a 50% do subsídio de Natal é necessário para prevenir derrapagens relativamente ao défice previsto. O povo português ouve, já nem reage, tão usuais são estas decisões, e espera, como sempre, que sejam as últimas, e que fique salvaguardado o futuro dos nossos filhos. Olho para a Grécia, um dos berços da nossa civilização, e concluo que algo está errado no meio de tudo isto. E fico triste, andamos todos tristes, meio impotentes para remar contra esta maré absolutamente avassaladora. Mas a verdade é que temos de ser nós reagir. Como? Trabalhando, como sempre, acreditando que é possível vencer, mais uma vez, o grande Adamastor. Se o vencemos no passado, não tenho dúvida de que voltaremos a vencê-lo. O pormenor está no “quando”.