terça-feira, dezembro 30

PROFECIAS

Disse um dia François de la Rochefoucauld mais ou menos assim: só é sensato quem é da minha opinião. Porque isto de ver bom-senso em quem nos afronta não é fácil… Ou por outra: exige de nós uma mão-cheia de áurea sabedoria. Há dias em que nos apetece ser sensatos, acordamos assim, dizemos a nós próprios “ hoje eu vou perdoar, vou ser bom menino” e pronto, passamos um dia porreiro, a descascar castanhas e a regá-las com vinho. Mas há outros em que, oh valha-me Deus, mais valia termo-nos colado ao colchão. Acordamos chatos, insuportáveis, e fazemos coisas do arco-da-velha.

Nestes últimos dias, deu-me para ler profecias. Não sei porquê, os novos profetas são todos da área financeira. Estamos no fim do mundo, é a bancarrota, vem aí uma guerra mundial, o Sócrates vai pedinchar no Sodré… É um ver-se-te-avias de avisos: eu avisei-te, eu sou Deus, avisei-te, para que compraste essa porcaria, não vês que a bolsa ainda vai cair mais… Estes são os profetas da desgraça, os corvos do pedestal, enfim, os sensatos.

2008 foi um ano muito mau. Mas não porque o ano seja mau, coitado, o ano não tem culpa nenhuma. A culpa, afinal, é dos outros sensatos, daqueles que, sabendo, fingiam que não sabiam. E o ano foi mau, muito mau.

Os corvos dizem que 2009 vai ser pior, muito pior, espirram. São corvos, são negros, miram de cima, do epicentro da tempestade. Espreitam. E aguardam a morte da presa.

O homem de bom-senso sabe que todas as tempestades têm o seu fim. O homem de bom senso sabe que, depois da noite escura vem o dia radiante. E aguarda, confiante, porque tem esperança e acredita.

Eu pressinto que 2009 vai ser um ano muito difícil, mas acredito que o sol ainda nele vai brilhar. Eu creio. E, ao contrário de la Rochefoucauld, dou de bandeja aos corvos os grãos da minha sensatez.

Um Feliz Ano de 2009 para todos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Realmente é verdade. Há dias em que acordo radiante, "feliz" com a vida (uma felicidade ilusória claro), alegre por apenas respirar. nesses dias todas as coisas me parecem belas, as cores são mais brilhantes, tudo vale a pena, porque estou viva. mas tammbém há aqueles dias em que tudo nos enerva, todos parecem conspirar contra nós, o mundo inteiro se for preciso. Contudo, esses "estados de alma" derivam muitas vezes de problemas que escapam ao nosso alcance, que na minha opinião é quase tudo. Com a nossa ânsia de controlar tudo na vida, andamos constantemente frustrados, por essa mesma razão. É que nós não controlamos nada. A única coisa que controlamos são as nossas acções e pensamentos (e fazemos isso muito mal por vezes), não o que é exterior a nós. tudo bem há contas a pagar, familiares doentes, entes queridos que morrem, etc. Mas o que resolve ficar frustrado com as contas que não são pagas? O que adianta deitar as culpas no patrão que não nos paga o suficiente, no banco que pratica juros impensáveis ou no estado que não dá ajuda suficiente? Ou o que dizer da morte? é claro que é duro, uma pessoa não deixa de sofrer. mas resolve alguma coisa fixarmo-nos nessa parte natural da vida? Não resolve nada. Em vez de perdermos o nosso precioso tempo de vida a culparmos tudo e todos, temos de encarar a situação, reconhecê-la como ela é e pensar na melhor maneira de a ultrapassar. o que fazer para arranjar mais dinheiro? Ou simplesmente aceitar que há coisas que simplesmente não podemos fazer nada para resolver, como a morte. Que, já agora, para mim não é o fim da vida. Para mim, morte é o contrário de nascimento. A nossa energia, aquilo que nos faz "funcionar", apenas se transforma (uma das regras da física). claro que é mais fácil falar do que agir, mas basta apenas dar o 1o passo, reconhecendo que simplesmente não adianta ficar frustrado pelo que se passa à nossa volta. Basta reconhecer que as coisas são como são e que gritar, espernear e culpar não resolve a situação. Ela já existe, independentemente de nós a querermos aceitar ou não...