sexta-feira, outubro 19


CAMÕES E QUEVEDO

Gosto dos poetas espanhóis, leio-os com prazer redobrado quando me alongo no sofá. Hoje, sem querer, encontrei Quevedo, nascido em Setembro de 1580, três meses depois do falecimento do nosso Camões - Junho de 1580. Nunca tive dúvida da universalidade do nosso poeta, mas alguns sonetos de Quevedo provam que ele era lido em Espanha e traduzido (ou plagiado?). Comparem-se estes dois sonetos e conclua-se o que for de concluir:


Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;
 
É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;
 
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.
 
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Es hielo abrasador, es fuego helado,
es herida, que duele y no se siente,
es un soñado bien, un mal presente,
es un breve descanso muy cansado.
 
Es un descuido, que nos da cuidado,
un cobarde, con nombre de valiente,
un andar solitario entre la gente,
un amar solamente ser amado.
 
Es una libertad encarcelada,
que dura hasta el postrero paroxismo,
enfermedad que crece si es curada.
 
Éste es el niño Amor, éste es tu abismo:
mirad cuál amistad tendrá con nada,
el que en todo es contrario de sí mismo.

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