A MORTE DOS AFETOS
A minha professora da quarta classe era extraordinária.
Impossível esquecê-la, tão importante foi na minha vida. Se sou um leitor voraz
e um escritor compulsivo, a ela o devo. As suas metodologias de ensino, as
estratégias utilizadas e, acima de tudo, o amor e o carinho que punha em todas
as suas ações só podiam ter consequências benéficas em jovens que, como eu,
iniciavam o sue percurso no mundo. Naquele tempo, confortar uma criança com um
sorriso ou com um toque nos seus cabelos era possível. Lembro-me de a minha
professora me levar, a mim e a outros colegas, para sua casa. O objetivo era
proporcionar-nos aprendizagens suplementares, tendo em vista o exame final que
se aproximava. As suas duas filhas, mais ou menos da nossa idade, conviviam e
aprendiam connosco. E assim evoluímos como seres humanos e nos tornamos homens
e mulheres puros e verdadeiros. Noticia-se na televisão o caso de uma
professora acusada de um relacionamento com um jovem de catorze anos. Sem nenhuma
prova, apenas porque alguém decidiu processá-la. A professora afirma que agiu
com o aluno exatamente da mesma forma como age com outros: sempre presente,
disponível, usando alguns meios como o telefone ou o correio eletrónico,
instrumentos banais do nosso quotidiano. Ouço esta professora a explicar as
circunstâncias do seu modelar trabalho e entristeço-me. A nossa sociedade tem evoluído
num sentido absolutamente negativo, no que respeita ao relacionamento humano.
Como podemos desenvolver as emoções dos nossos filhos se é proibido tocar-lhes,
acarinhá-los, abraçá-los, beijá-los? Como se transmite a confiança e o
sentimento do amor? Ontem o Rui dizia, em conversa de café: ─ Eu nunca beijei
ou abracei o meu pai. Fiquei estarrecido com esta frase. O Rui é, ou será,
um ser humano feliz?